André De Rose

O que é o Yoga?

Existem muitas definições usadas atualmente para Yoga, algumas antigas, outras modernas. A definição que mais me agrada postula que o Yoga é a metodologia baseada nos textos hindus (shastras) para conduzir ao estado de iluminação interior (samádhi).

Mas, ele não é apenas um conjunto de técnicas que levam a pessoa a um determinado lugar ou estado, ele é bem mais do que isso, é todo um movimento cultural comportamental e filosófico que possui certas características que o definem como tal, formando uma prática de corpo, mente e coração.

Definir o que é, e o que não é Yoga é uma tarefa bastante complexa. Muito se comenta sobre o tema na atualidade, possuímos distintas definições formuladas pelos mais diversos professores e escolas, mas sempre temos a sensação de que foi pouco. E o Yoga acaba sempre sendo mais do que as palavras podem expressar.

Eu garanto não adianta explicar o que é o Yoga, você precisa experimentar é uma experiência única e você vai adorar!

Eu posso especular muito sobre o que eu faço, mas como eu poderia falar em nome de todos os outros tipos de Yoga? Então quero alertar o leitor que na maior parte do tempo estou me referindo aos conceitos filosóficos da minha linha e estou convidando você a olhar comigo o Yoga através dessa lente, que inevitavelmente estará magnificando os pontos em que eu acredito e que não necessariamente são compartilhados por todos.

Mesmo assim vamos tentar dar um panorama geral sobre essa milenar filosofia, venha comigo ver ponto por ponto.

Basicamente Yoga trata de disciplina

As pessoas vivem me dizendo ah professor, fazer Yoga é natural né? E eu respondo que é uma das coisas mais antinaturais que existem. Confesso que me divirto com a cara de surpresa que o interlocutor faz para mim, mas ai eu continuo o discurso e digo: essa prática visa divinizar o humano, nos torna melhor do que somos e tem a pretensão de desenvolver todo o nosso potencial. Afinal de contas natural é estar com vontade de urinar e fazer naquele instante, não esperar para ir ao banheiro, ou então se sentir atraído por alguém e querer tirar-lhe a roupa e consumar o ato no meio da multidão. Todos nós temos um mínimo de disciplina, é sobre isso que boa parte do Yoga trata. Buscamos ser mais que apenas animaizinhos atrás de instintos e desenvolvemos um soberbo autocontrole sobre a vontade, sem a qual não dá nem para engatar a primeira marcha e fazer o básico na pratica do Yoga.

O Yoga se desenvolveu ao longo de milênios e reúne o conhecimento acumulado e testado por várias gerações de Yogis dedicados, possuindo um conjunto de procedimentos que abarcam todas as possibilidades humanas. Só que em um determinado momento ficou tão inflado que precisou se especializar criando com isso não apenas as tendências de cada professor, mas também toda uma série de diretrizes novas.

Algo bastante interessante que devo ressaltar é o fato evidente que cada pessoa tem certa liberdade de adaptar e até mesmo improvisar um pouco daquilo que será transmitido adiante, dependendo unicamente da sua sensibilidade e experiência pessoal. Contagiando aos poucos uma legião de fãs para essa nova vertente. Com o passar do tempo, aumentando a quantidade de pessoas que praticam esse princípio ele é levado adiante tornando-se um sistema legitimo, como deve ter acontecido com os sistemas que hoje são considerados clássicos, um dia eles também foram novidade em sua época. Devemos ter consciência de que Yoga esta sujeito a elementos sutis e essa subjetividade é o maior tempero da nossa prática, é o que lhe dá alma.

Yoga é uniãoA palavra sânscrita Yoga possui quase trinta traduções, entretanto convencionou-se dar o sentido de união, mas podemos traduzi-la também como trabalho e aplicação. Ou seja, Yoga é o meio e o fim ao mesmo tempo. A tradução mais universalmente aceita é união porque a finalidade do Yoga é produzir no ser humano uma grande alteração na percepção ordinária da realidade, acarretando uma tomada de consciência daquilo que na realidade já somos.

Eu comparo essa percepção em menor escala ao artista que consegue perceber num buraco na parede um jogo de luzes e sombras que você poderia ter visto, seu amigo do lado também, e que ninguém mais viu só ele. Ele teve a sensibilidade para captar um momento único e mágico, e somente ele conseguiu trazer a tona essa percepção na forma de uma pintura, foto, escultura ou poesia. Alcançando as demais pessoas, fazendo uma ponte para que o homem comum também pudesse se emocionar com a sua percepção. É isso que o mestre de Yoga procura! Usar os mecanismos e as técnicas necessárias para sensibilizar o discípulo para que este possa perceber o mesmo que ele.

Yoga é considerado de tradição shruti, ou seja, ninguém teria elaborado formalmente seria um tipo de revelação que já vem pronta e não é intelectualizada. Para nós, ocidentais acostumados ao pensamento cartesiano, quadrado, analítico, podemos acreditar nisso apenas em relação ao conceito filosófico do Yoga, não a todas suas técnicas; principalmente quando ao analisar os textos mais antigos verificamos que técnicas que antes não constavam em determinado momento histórico, assim que são citadas em uma escola, passam a ser repetidas nos textos escritos posteriormente, indicando claramente uma evolução, uma adaptação.

Yoga é um dárshanaO Yoga Sútra formulado por Pátañjali é um divisor de águas e norteia todos os estilos de Yoga a partir de então, todos respeitam a autoridade desse texto escrito em 360 antes de cristo, que ficou conhecido como Yoga Clássico. Sua obra é a mais antiga sistematização do Yoga que chegou aos nossos dias e foi incorporada como um dos seis pontos de vistas, dárshanas, do hinduísmo.

Por sua importância histórica, Pátãnjali é reverenciado em algumas linhas de Yoga, como o Pai do Yoga, não pela criação da prática que já existia muito antes, mas por ter feito a primeira sistematização completa dessa filosofia e ter fixado as bases da forma como é transmitida até hoje.

A partir daí, até a atualidade, centenas de métodos e novos estilos se desenvolveram. Assim, para falar sobre Yoga temos que pensar… como um monte de estilos tão diferentes um dos outros chamam-se todos Yoga? Eles devem ter algo em comum, caso contrário não teriam a mesma denominação. Então vamos recuar um pouco no tempo e pensar como isso ocorreu.

Segundo as tradições mais ortodoxas essa prática teria sido trazida por Shiva, que para algumas escolas seria um homem comum, e para outras um deus com poderes ilimitados. O que eu posso afirmar é que de comum essa pessoa não tinha nada, imagine o carisma que ele tinha, capaz de contagiar uma legião de pessoas ao longo de mais de cinco mil anos. Aliado, é claro, a assombrosa eficiência dessa boa nova. Desde então Shiva passou a ser um ícone, um modelo de perfeição a ser seguido. Ele inspirou pessoas no mundo inteiro a seguir seus passos.

O Yoga Antigo

Muito se fala em Yoga autêntico, mas o que seria isso? De certa forma todos os estilos de Yoga são autênticos, não existiria um mais autêntico que o outro. O que classificaria um Yoga assim? A antiguidade? Não podemos classificar algo pela sua ancestralidade, isso seria pouco inteligente, sua legitimidade como método é muito mais dependente de sua eficiência como prática do que quanto a sua antiguidade.

Não sabemos o que os ancestrais praticavam, pois não há registro escrito desse momento histórico, entretanto sabemos o que não existia nesse Yoga arcaico. Alguns itens que temos certeza não existiam nesse Yoga mais primitivo eram os mantras falados em sânscrito, porque essa língua só começou a ser proferida com a incursão dos arianos na índia muito tempo depois, não existia yoganidrá que só apareceu com esse nome e essas características no século passado nas mãos do Satyánanda, não existiam tantos ásanas, pois os mais antigos e completos textos que colecionam essas posições corporais mal chegam há 30 técnicas isso no período medieval do Yoga, ou seja, há pouco mais de 800 anos atrás e 4200 anos depois que o Yoga já havia sido criado! O mesmo acontece com as kriyás, os pránáyámas a pújá e assim vai.

Tecnicamente não existe um Yoga pré-clássico, conquanto não exista também nenhum registro desse momento na história, outro, porém é que atualmente não há pessoas que o pratiquem. Tentar resgatar esse hiato é também enxugar demais o numero de opções e possibilidades que temos hoje em dia, dado que milhares de anos depois a quantidade de contribuições de técnicas e experiências de sucesso foram alcançadas ao longo do tempo. Resumindo se quiséssemos mesmo fazer esse Yoga da origem teríamos pouquíssimos ásanas, quase nenhum mantra, meia dúzia de pránáyámas, nenhuma yoganidrá e um único tipo de meditação. Ou seja, praticar o Yoga como ele era na sua origem é equivalente a usar hoje em dia um telégrafo no lugar de um telefone para comunicar-se.

O que existe do período pré-clássico são os Shastras, coletânea de livros e textos antigos, que estão recheados de detalhes sobre esse tipo de sistema. Filosoficamente estamos bem amparados, mas não temos as informações de como na prática era realizada, a não ser a sobre grande limitação das técnicas empregadas, como já foi comentado.

Ainda assim podemos praticar conceitualmente esse tipo de Yoga, utilizando o amparo filosófico registrado nos shastras, com a grande vantagem de poder contar com as mais modernas e eficientes técnicas desenvolvidas nos últimos milhares de anos.

Essa proposta de aprender com os ensinamentos dos Mestres e praticantes que contribuíram para o desenvolvimento do Yoga nos últimos cinco mil anos, e aplicar estas técnicas com a inspiração e fundamentação filosófica nos shastras antigos, é um dos principais elementos de identificação entre os professores associados ao Yoga Natarája